Ebook DTM

2 - Epidemiologia das Disfunções temporomandibulares

Autores: Roberto Brígido de Nazareth Pedras e Isabela Maddalena de Souza Lima Dias

As disfunções temporomandibulares (DTM) englobam um grupo de condições musculoesqueléticas e neuromusculares que envolvem a articulação temporomandibular (ATM) os músculos mastigatórios e tecidos associados.  Representam a principal causa de dor não dentária na face e são consideradas um tipo de desordem musculoesquelética1.

Os estudos epidemiológicos das DTMs objetivam a obtenção de informações que possibilitem o diagnóstico populacional desta condição e o fornecimento de dados fundamentais para o planejamento, organização e avaliação das ações públicas necessárias a fim de se obter uma melhoria na qualidade de vida dos indivíduos acometidos2. A literatura tem mostrado que as DTM são uma condição clínica comum, podendo envolver disfunção e/ou dor dos músculos mastigatórios, desarranjos internos, e/ou dor na ATM. Estudos epidemiológicos clínicos e populacionais indicam que os sinais (por ex. ruídos articulares, sensibilidade à palpação, limitação do movimento mandibular) ou os sintomas (por ex. dor na face, dor muscular e/ou articular) podem aparecer em até 60-70% da população3,4,5. Apesar disso, a prevalência relatada de casos que requerem tratamento por dor ou incapacidade funcional é de 5 a 12%6.      

Um grande estudo coorte prospectivo (OPPERA) estimou que, a cada ano, 4% dos adultos saudáveis com 18 a 44 anos de idade, desenvolvem DTM dolorosa7, sendo essa faixa etária também a que apresenta o pico de incidência da DTM3,5,8,9. As mulheres são pelo menos quatro vezes mais propensas a sofrer do transtorno3. Fatores anatômicos como frouxidão ligamentar, aspectos comportamentais (acúmulo de atividades na fase reprodutiva) e alterações hormonais ligadas ao ciclo menstrual também foram estudados no intuito de justificar a maior prevalência de DTM no sexo feminino10.

A prevalência de DTM tem aumentado nos últimos anos, afetando negativamente a qualidade de vida desses indivíduos e, por isso,  torna-se mais evidente a necessidade de esclarecer as características e os fatores de risco mais predominantes nessa condição11. Esse aumento também tem ocorrido com relação a novos casos de dores crônicas por DTM. Portanto, os impactos na qualidade de vida dos pacientes têm merecido relevância nas investigações em saúde pública12. A dor orofacial é uma apresentação comum na atenção primária à saúde e a DTM representa uma das principais causas dessa queixa5.

A dor é uma condição que trás consigo limitações e sofrimentos.  Conviver com esse sintoma pode trazer consequências físicas e emocionais, além de demandar tratamentos muitas vezes onerosos, além de reduzir a produtividade e comprometer a qualidade de vida13. As DTMs representam uma das principais causas de condições musculoesqueléticas resultantes de dor e disfunção, perdendo apenas para dor lombar crônica14.

No Brasil, estima-se que a prevalência de sinais e sintomas de DTM varie entre 40 a 50% na população adulta, 20 a 30% entre os adolescentes e em torno de 16% em idosos15. Estudos que investigaram a presença de DTM em crianças e adolescentes, com idades entre 10 e 17 anos, encontraram taxas de prevalência variando entre 33,2% e 36,1%11,16,17. Outro estudo utilizando o Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disrorders (RDC/ TMD) como instrumento de avaliação, investigou a presença de DTM em escolares com 08 a 10 anos de idade em Cabreúva (SP) e encontram taxa de prevalência de 49,4%18.

Estudo conduzidos no Brasil com amostras de indivíduos adultos apontam altas taxas de prevalência de sinais e sintomas de DTM. Mello et al., (2014) identificaram que 42% de uma população com idade variando entre 15 e 70 anos apresentavam diagnóstico de DTM19. Progiante et al. (2014) avaliaram a dor por DTM em uma população de 20 a 65 anos de idade e a prevalência verificada foi de 36,220. Gonçalves et al. (2010) encontraram prevalência de 25,6% de sintomas dolorosos relacionados com a DTM em uma população com 15 a 65 anos de idade, enquanto a prevalência de qualquer sintoma foi de 39,2%21.

Em relação à prevalência entre indivíduos idoso, um estudo realizado em Feira de Santana (BA) identificou sintomas de DTM em 50,2% da população acima de 70 anos de idade22.  

De modo geral, os levantamentos epidemiológicos indicam uma prevalência alta de sinais, sintomas e também do diagnóstico de DTM (Tabela). Entretanto, a diversidade dos instrumentos utilizados para avaliação de DTM, a faixa etária estudada e os objetivos propostos em cada estudo limita a comparação dos resultados. Dessa forma, torna-se evidente a importância da realização de mais estudos para avaliar a prevalência, os fatores de risco e a distribuição das DTMs no Brasil, a fim de guiar o planejamento de ações e políticas públicas para a prevenção, bem como para um melhor diagnóstico e manejo dos pacientes com essas condições15.


 
  • Tabela: Resumo de taxas de prevalência de DTM encontradas por estudos realizados no Brasil

Roberto Brígido de Nazareth Pedras

Sócio fundador da SBDOF. Coordenador da Comissão de Saúde Pública da SBDOF.  Especialista em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial pelo Conselho Federal de Odontologia.  Mestre em Saúde da Criança e do Adolescente pela FMUFMG. Professor Adjunto do Curso de Odontologia da Newton.  Diretor Administrativo da SOMED


Email: robertopedras@yahoo.com.br
Instagram: @dor.robertopedras

Isabela Maddalena de Souza Lima Dias

Sócia efetiva da SBDOF.
Cirurgiã- Dentista pela Universidade Federal de Juiz de Fora.
Especialista em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial pela ABO/ FASE-Petrópolis.
Pós-doutora em Saúde Coletiva- Faculdade de Medicina- Universidade Federal de Juiz de Fora.

Email: isabelamdias@gmail.com
Instagram: @isa_maddalena

​Referências Bibliográficas:


1. de Leew. R. Orofacial Pain. Guidelines For Assessment, Diagnosis, and managment. The American of Orofacial Pain. Chicago: Quintessence, 6 th ed, 2018.
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3. Sharma S, Gupta DS, Pal US, Jurel SK. Etiological factors of temporomandibular joint disorders. Natl J Maxillofac Surg. 2011; 2(2):116–19. doi: 10.4103/0975-5950.94463.
4. Conti, Paulo César Rodrigues, DTM: Disfunções temporomandiulares e Dores Orofaciais: aplicação clínica das Evidências científicas. Maringá, PR: Dental Press, 2021.
5. Lomas J, Gurgenci T, Jackson C, Campbell D. Temporomandibular dysfunction. Aust J Gen Pract. 2018 Apr; 47(4):212-215. doi: 10.31128/AFP-10-17-4375
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8. Gauer RL, Semidey MJ: Diagnosis and treatment of temporomandibular disorders. Am Fam Phys. 2015; 91(6):378-386. PMID: 25822556
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14. National Institute of Dental and Craniofacial Research – NIDCR. Facial pain. Bethesda: National Institutes of Health. 2008.
15. ALVARENGA, Mariana Guimarães Jorge, PAULA, Janice Simpson, VETTORE, Mário Viana. Epidemiologia das Disfunções Temporomandibulares no Brasil. In: PEDRAS, Roberto Brígido de Nazareth; DIAS Isabela Maddalena de Souza Lima (org.). Disfunções Temporomandibulares. Uma Abordagem dentro do contexto de saude pública. p. 35-47. Disponível em: http://eventossbdof.com.br/painel/cliente/arquivos
16. Melo Junior FA, Aroucha JMCNL, Arnaud M, Lima MGS, Gomes SGF, Ximenes R, Rosenblatt A, Caldas Jr AF. Prevalence of TMD and level of chronic pain in a group of Brazilian adolescents. Plos One. 2019; 14(2):1-13. doi: 10.1371/journal.pone.0205874
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22. Sampaio NM, Oliveira MC, Ortega AO, Santos LB, Alves TDB. Temporomandibular disorders in elderly individuals: the influence of institucionalization  and socialdemographic factors. CoDAS. 2017; 29(2):1-6. doi: 10.1590/2317-1782/20162016114 
23. Khan K, Muller-Bolla M, Teixeira Junior OA, Gornitsky M, Guimarães AS, Velly AM. Comorbid conditions associated with painful temporomandibular disorders in adolescents from Brazil Canada and France: A cross-sectional study. J Oral Rehabil. 2018;47(4):417-424. doi: 10.1111/joor.12923