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Effects of occlusal splint therapy on opposing tooth tissues, filling materials and restorations

Resenha escrita por: Gustavo Augusto Seabra Barbosa

As placas oclusais são dispositivos intraorais removíveis, geralmente confeccionados em resina acrílica e comumente usados ​​como uma alternativa terapêutica das disfunções temporomandibulares (DTM) e como proteção dos dentes frente aos efeitos do bruxismo1. Seus mecanismos terapêuticos ainda não estão totalmente esclarecidos, embora muitas sugestões tenham sido feitas3: (1) mudanças no mecanismo de feedback de entrada dos receptores orais periféricos; (2) mudanças na consciência cognitiva4; (3) efeito placebo; (4) alteração da posição condilar, dentre outros1.

Apesar de muitos estudos apoiarem a eficiência do tratamento utilizando os dispositivos oclusais para o Bruxismo do Sono (BS), as evidências científicas são insuficientes para afirmar seu papel na redução em longo prazo da atividade desse bruxismo2. Tais dispositivos contribuem mais para a proteção dos dentes naturais (e restaurações) do desgaste excessivo e podem agir para dissipar as tensões extras geradas devido ao BS. Essa é a terapia mais popular para o “controle” e prevenção das consequências do BS4.

O material mais empregado para a confecção desses dispositivos pela técnica convencional é a resina acrílica rígida à base de Polimetilmetacrilato (PMMA), que pode ser ativada quimicamente ou termicamente. Entretanto, com a evolução da tecnologia digital na Odontologia, atualmente estes dispositivos podem ser confeccionados utilizando-se materiais com diferentes composições, que podem ser mais “macios” ou rígidos em relação ao material convencional. O uso de materiais rígidos sempre foi mais associado à proteção das estruturas dentárias; porém, será que esses materiais que apresentam maior dureza realmente estão protegendo os dentes e as restaurações? Ou podem promover o desgaste destes materiais?1

O artigo que será comentado nesta resenha, publicado recentemente, utiliza um estudo experimental in vitro para avaliar o comportamento do desgaste da dentina, esmalte, de cerâmicas vítreas e de resinas compostas quando antagonistas das placas oclusais confeccionadas em resina acrílica ativada quimicamente (AQ) e termicamente (AT). Os autores utilizaram corpos de prova com dentina e esmalte bovinos, resinas Filtek Z250 (Z250), Clearfil AP-X (AP-X), Clearfil Majesty Posterior (CMP), Filtek Supreme XTE (FSE) e uma cerâmica vítrea IPS Emax CAD (EMAX). Contra esses materiais, utilizaram como material da placa uma resina à base de PMMA ativada quimicamente (AQ) e outra termicamente (AT), bem como um aço inoxidável como grupo controle1.

Os espécimes foram divididos em grupos e dispostos em duas rodas que giravam e faziam atrito entre os materiais, como também eram submetidos a outras forças de compressão e tração que também poderiam afetar a resistência à fratura dos mesmos. Essas rodas foram medidas no início e no final do teste de desgaste (para avaliar a quantidade de desgaste), sendo pressionadas uma contra a outra com uma força de 15N à velocidade de 1 Hz, girando em 200.000 ciclos. Os autores avaliaram também as superfícies desgastadas por meio de microscopia eletrônica de varredura com aumento de 5000x1.

Após análise dos resultados, os autores observaram uma maior quantidade de desgaste para a dentina, seguido em ordem decrescente pelas resinas compostas e esmalte, sendo o EMAX o material com menor desgaste. Quando compararam os tipos de placa, as AT apresentaram maior desgaste nos materiais antagonistas. A quantidade desse desgaste na dentina chegou a ser 10 vezes maior para as placas AT quando comparada às AQ. Além do desgaste dos materiais antagonistas, também foi observado o desgaste no material das placas, sendo maior nas confeccionadas em AQ. A microscopia eletrônica apresentou um padrão topográfico de desgaste similar nos diferentes materiais analisados, variando apenas em quantidade1.

Com base nesses resultados, os autores sugeriram um protocolo de escolha para a seleção do material frente às necessidades particulares do paciente com bruxismo. Por exemplo, em antagonistas com remanescente em esmalte, resinas compostas ou restaurações em Emax, a placa AT estaria indicada, enquanto que, para pacientes com grande quantidade de dentina exposta, as AQ deveriam ser as escolhidas. Alguns pontos também foram discutidos como a liberação de monômero residual, que pode ser maior em AQ, o que não seria o ideal biologicamente. Outro fator é que materiais menos resistentes podem requerer maior manutenção e ter um tempo de vida útil menor. Em contrapartida, os materiais que não apresentam muito desgaste podem ser muito “agressivos” para o antagonista1. 

Os autores concluem, dentro das limitações do estudo, que o nível de desgaste do esmalte, dentina e de várias resinas compostas foi maior em contato com as placas AT do que AQ, sendo o desgaste da dentina o maior. E que a escolha do material da placa oclusal deve ser baseada nas necessidades clínicas específicas do paciente com bruxismo1.

Considerações 

Apesar da limitação de um estudo in vitro, os dados são importantes para o delineamento de novos estudos clínicos, bem como para reavaliarmos os tipos de materiais utilizados para confecção das placas oclusais, principalmente com as novas tecnologias que permitem a utilização de diferentes tipos, inclusive de polímeros bem mais rígidos a base de poliéter-éter-cetona (PEEK). Embora se acredite que os dispositivos oclusais sempre atuam “protegendo” os dentes e restaurações, dependendo da situação clínica, podem não apresentar tanta eficácia nesse objetivo.

Materiais mais rígidos podem ter as vantagens da resistência à fratura e durabilidade, porém podem promover o desgaste dos seus antagonistas, dependendo do material. Já materiais com menor rigidez podem preservar os antagonistas, mas terem sua resistência e durabilidade comprometidas. Outros pontos ainda devem ser avaliados como solubilidade, liberação de monômero residual, qualidade do polimento final do material, dentre outros. 

O ideal seria que, em pacientes com bruxismo, a situação clínica fosse avaliada individualmente e até discutida com o próprio paciente em relação às vantagens e desvantagens de cada material e ao custo-benefício do tratamento. Somente após isso, a escolha do melhor material para a placa oclusal deve ser realizada.


Referências:

1. Effects of occlusal splint therapy on opposing tooth tissues, filling materials and restorations. Osiewicz MA, Werner A, Roeters FJM, Kleverlaan CJ. J Oral Rehabil. 2021 Oct;48(10):1129-1134. doi: 10.1111/joor.13235. Epub 2021 Aug 18. PMID: 34320246.

2. Jokubauskas L, Baltrušaitytė A, Pileičikienė G. Oral appliances for managing sleep bruxism in adults: a systematic review from 2007 to 2017. J Oral Rehabil. 2018;45(1):81-95.

3. Sjoholm T, Kauko T, Kemppainen P, Rauhala E. Long-term use of occlusal appliance has impact on sleep structure. J Oral Rehabil. 2014;41(11):795-800.

4. Singh PK, Alvi HA, Singh BP, Singh RD, Kant S, Jurel S, Singh K, Arya D, Dubey A. Evaluation of various treatment modalities in sleep bruxism. J Prosthet Dent. 2015;114(3):426-31.
 
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Gustavo Augusto Seabra Barbosa

  • Especialista em DTM e Dor Orofacial (Instituto de Ensino Odontológico - Bauru);
  • Mestre em Reabilitação Oral – Universidade Federal de Uberlânida (UFU)/MG;
  • Doutor em Reabilitação Oral – Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto / Universidade de São Paulo (USP);
  • Professor Associado IV do Departamento de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN);
  • Coordenador do CIADE/UFRN (Centro Integrado de Atendimento a portadores de DTM e Dor Orofacial);
  • Coordenador da Base de Pesquisa GEPRO-UFRN (Grupo de Estudos e Pesquisas em Reabilitação Oral). 
E-mail: gustavoaseabra@hotmail.com
Instagram: @gustavoaseabra